Não lembro-me da ultima vez em
que senti medo das pessoas, na verdade, o medo vinha de todos os lados,
sentia-me como se estivesse num umbral, e sinceramente, esquartejavam
silenciosamente toda confiança que demorei a adquirir.
Implicavam com meu cabelo, com
meu jeito de andar, implicavam com meus gostos e fechavam suas caras, sem
contar que das inúmeras vezes que fui entrevistada a preencher vagas de
emprego, ao perceberem o que sou, me fechavam as portas como se fosse de outro
mundo, ou melhor, como se não pertencesse aquela sociedade imunda...
Agora querem me curar... Me curar
de quê? Nunca estive doente, apenas não pertencia aquele corpo, não me
reconhecia ou melhor, o vazio me tornava cada vez menos humana, eu não queria
aquele reflexo, aquela voz, eu não pertencia aquele lugar, era como se minha
pele fosse revestida de outra alma, sim, eu apenas não me reconhecia e mesmo
assim, eu era crucificada..
Apedrejavam meus sonhos e mais,
violentavam minhas vontades e meus direitos, e me empurravam goela abaixo um
personagem que não me cabia no peito, eu não queria ser aquele tipo de ser
humano revestido de ignorância, bem verdade, aquela sociedade imunda me rotulava
de todos os adjetivos possíveis, e eu, NÃO OBRIGADA A ACEITAR uma identidade
que não me cabia, então, eu era exposta...
Não me queimem, pois não posso
abolir de mim o que sou... para os ignorantes, eu nunca fui homem, aquele corpo
não me pertencia, na verdade, desde que me entendo por gente eu me via
absolutamente perfeita, e sinceramente, não me venham com o velho discurso
sobre como nasci, é patético, quiça, constrangedor para quem se diz
inteligente...
NÃO ME QUEIMEM, pois não posso
abolir de mim o que sou...
Autor: Leandro C. de Lima